Saúde mental e a deficiência visual

Primavera contrasta com epidemia de suicídios; Setembro Amarelo promove prevenção e conscientização, focando em grupos vulneráveis e apoio social.
Desenho de cabeça aberta saindo flores e ao centro ícone de pessoa com deficiência visual.

A primavera traz consigo a expectativa de cores, aromas, beleza e revigoramento de energias. Apesar deste conceito de melhor qualidade de vida ligado a mais exuberante das estações, nossa sociedade vem atravessando uma epidemia grave e recorrente com uma perda enorme de vidas. Atentos a isso, desde 2015, foi criada uma campanha O Setembro Amarelo, que se destina a prevenir e conscientizar a população sobre o suicídio. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), todos os anos são registrados mais de 800 mil casos desse problema. O número equivale a uma morte a cada 40 segundos. Na população jovem, de acordo com o S.U.S. (Ministério da Saúde/DATASUS/MS) a taxa de mortalidade junto a esse público, na faixa etária dos 15 aos 30 anos representa 11.433 mortes, sendo a maior causa de perda de indivíduos em sua fase mais produtiva.

Abordar esse tema, ainda é assunto muito delicado, envolvendo preconceito, formas de pensamento que temem prejudicar os envolvidos e os familiares que tentam superar o doloroso processo pelo qual passaram e muitos ainda o enfrentam.

Em estudos feitos sobre o suicídio, há a observação de que pode estar relacionado a diversos tipos de doenças, como a AIDS, esclerose múltipla, doença de Parkinson. Quanto as doenças de ordem psiquiátrica, vários autores citam a depressão, delírios, ansiedade, transtornos de personalidade, uso abusivo de substâncias como o álcool e outras psicoativas.

Pessoas com deficiência visual, intelectual, transtornos mentais e auditivos, também fazem parte do número de identificações entre os que tentaram tirar a própria vida.

No caso da deficiência visual, fatores como a estigmatização do indivíduo, caracterizando-o com limitações psicológicas, físicas e dificuldade na realização de tarefas, podem levar a pessoa ao distanciamento social e isolamento, encobrindo assim todo seu potencial como profissional e participante de atividades agregadoras. Muitos desses fatores, podem implicar na saúde mental dessa pessoa, que se, não for bem acolhida, pode levá-la a uma ideação suicida. Sentir-se desvalidado, ou não fazendo parte de um grupo ou comunidade, reforçam o sentimento de não pertencimento, o que pode ocasionar em alguns casos uma consequência desastrosa.

Muitas comorbidades podem fazer parte do agravamento psicológico, mental e físico dessa pessoa. Doenças como a depressão, o stress, baixa autoestima, se não bem notadas por quem acompanha esse indivíduo, podem desencadear alguns comportamentos que precisam ser muito bem observados. A negligência com a higiene, o autocuidado físico, o autoabandono de sua saúde, o afastamento social.

No caso de uma observação mais apurada, na mudança de comportamento dessa pessoa, tenha ela a deficiência que tiver, é muito importante, como ferramenta de apoio conversar sobre o tema suicídio, tornando mais amplas as informações a respeito dos sinais de alerta para proteção dessa pessoa.

Abordar a dor e falar sobre ela, ainda é uma ferramenta de suporte e amparo. Promover palestras, contação de histórias, rodas de conversa, trocas e acolhimento que fortaleçam o indivíduo no despertar de sua resistência interior. Tratar com muito respeito a condição de sofrimento pela qual ela está passando. Geralmente, há na vida dessa pessoa desânimo, frustração, desencanto e muita raiva contida. Atentar para situações e falas como: ” a vida não vale a pena; não faço falta na vida de ninguém”; são colocações, que podem estar manifestando ideias de autodestruição.

Comportamentos como a mudança de humor, excesso de irritação, culpa, pensamentos de vingança, podem ser sintomas de que internamente essa pessoa se encontra extremamente desorientada sem saber que rumo dar a sua existência. Familiares, amigos, colegas de trabalho, podem ser agentes de auxílio nesses momentos. A presença da família respaldando e acolhendo, faz uma enorme diferença no sucesso do atendimento.

O acolhimento deve ser feito com delicadeza, buscando mais ouvir do que falar, evitando desmerecer o sentimento que a pessoa está expressando. Deixá-la fazer suas colocações, desabafar, nunca criticar ou dizer a ela que não há motivos para sentir-se assim. Determinadas palavras e atitudes, poder vir a reforçar a sensação de abandono desse indivíduo.

Apoiá-la oferecendo-se a acompanhá-la ao médico, pode transmitir segurança e a sensação de que ela é vista, de que não está só. Apenas médicos, psiquiatras, psicólogos ou neurologistas, podem fazer uma avaliação mais precisa do quadro. Em mitos casos, há a necessidade da introdução de medicamentos específicos para cada caso

Desde o nascimento a nossa história de vida inicia-se pelo olhar dos nossos pais ou daqueles que nos ajudam a crescer e amadurecer através dos cuidados. Isto requer amor e cuidado, atenção, paciência e limites. Isto feito, é a primeira base que temos para amar a vida e ser feliz.

Ter compromisso, sensibilidade, conhecimento, preocupação com outro ser humano e a crença de que a vida é um aprendizado que vale a pena – são os principais recursos que os profissionais de saúde têm; apoiados nisso eles podem ajudar a prevenir o suicídio.

A avaliação para pessoas com comportamento suicida deverá, ser realizada por um profissional da saúde experiente nesta questão, pode ser feita em níveis ambulatoriais e hospitalares. A relação de confiança é fundamental entre o paciente, a família e os profissionais envolvidos. De igual importância é o apoio familiar em relação a motivação e valorização. Quanto ao tratamento, é realizado com medicamentos (antidepressivos, antipsicóticos, ansiolíticos) e controle, pois estes fármacos normalmente fazem efeitos em torno de duas semanas, e consultas regulares com psiquiatra e psicoterapeuta que complementam o tratamento.

A Laramara sempre está atenta as questões biopsicossocial dos seus atendidos e dos seus familiares. Desde 1996 os assistentes sociais e os psicólogos da Laramara através do atendimento dos usuários, organizados em grupos denominados grupo psicossocial, são atendidos com demandas das mais diversas e acolhidos com garantia de plena de respeitosa escuta. Os casos específicos que apresentarem atenuantes importantes, são encaminhados para a Psicologia ou Psiquiatria dos recursos da comunidade.

Em relação à pessoa com deficiência, o parecer se relaciona com o preconceito e a intolerância. Esse comportamento de segregação da sociedade na relação com as pessoas com deficiência pode ser caracterizado como uma manifestação do capacitismo. O capacitismo consiste na desvalorização e desqualificação das pessoas com deficiência com base no preconceito em relação à sua capacidade corporal e/ou cognitiva.

A prevenção ao suicídio associado à vulnerabilidade material acontece pelas razões já mencionadas acima e muitas outras. A principal forma de prevenção se constitui através do fortalecimento das políticas públicas de garantias de direitos, como o da saúde, educação, assistência social, moradia, renda e segurança.

Finalizando cabe reforçar que essa campanha tão importante e necessária em nossa sociedade, deve ocorrer todos os dias do ano. Olhar as necessidades apresentadas por pessoas que atravessam deficiências mentais, físicas e emocionais, podem auxiliar na inclusão do indivíduo, permitindo que o socorro chegue antes da ação final. A prevenção sempre é muito mais eficaz do que esperar que quadros como esses se agravem.

O apoio a essa proposta do setembro Amarelo, por parte da sociedade, certamente fortalecerá quem estiver passando por essa situação, e quem sabe, conseguiremos diminuir esse doloroso ranking de perdas e sofrimento.

Que possamos ter sempre um olhar atento pela vida. Tantos Seres Humanos cruzam o nosso caminho no dia a dia, utilizemos o olhar atento, para ajudar e até mesmo reconhecer nossa incapacidade de ajuda, mas evitemos abandonar nosso semelhante com uma fala como: “não tenho nada com isto, não posso fazer nada sobre o caso”. Não nos esqueçamos de que a prática da humanidade é um exercício. Uma vida vale muito e muitas vezes o que essas pessoas necessitam é serem ouvidas, ou, de um braço amigo para as acolher e amparar. Lembremo-nos de Sermos Humanos!

Texto elaborado por:

Vera A. Salgueiro Pereira – CRESS 8212

Olga Maria Marques Di Dio – CRP 06/124785

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